domingo, 10 de março de 2013

Domingo, 14 de Outubro de 2012

Isso tudo parece uma grande loucura. Entre ruas, ruídos, redes sociais, momentos banais, copos de água, conversas vazias, noites repletas de dor, dias bonitos, céus azuis, ligações telefônicas, expectativas, lembranças. E muito mais. Tudo cheira a decadência, e a renovação. Tudo sai do lugar, e para de fazer sentido. Tudo grita, cada segundo grita por sua morte, para que outro possa substituí-lo.
Somos tocados como gado para dentro de galpões escuros, e não sabemos o que há ali dentro, o que nos espera. Somos atingidos por raios de luz em nossas faces, que nos ofuscam a vista. Somos lavados por fluxos contínuos, jorros de prazer extenuante. Somos cercados por infinitos estímulos, diferentes atividades simultâneas que nos fazem esquecer umas das outras, e por fim, esquecemos tudo. Somos o que somos, e somos tudo e nada.
Eu gosto de ver, à beira de alguma estrada, pela janela do carro, casas abandonadas em meio aos pastos. A tinta descascada, os tijolos à mostra, os pedaços faltando. Fico imaginando as teias de aranhas nos cantos entre as paredes e o teto, os bichos que se refugiam ali, usando como abrigo o que já abrigou, quem sabe, uma família, uma pessoa solitária, um casal apaixonado. Um prédio obsoleto, que já não tem mais sentido agora, mas que persiste, impõe sua presença perante o futuro, incomodando alguns, e despertando os sonhos de outros, como eu. E, talvez, esse prédio ainda fique por muito tempo ali, despertando a curiosidade de alguma criança que olha pela janela, sempre fascinado com o mistério que uma simples construção pode evocar, com as infinitas possibilidades do destino de qualquer coisa nesse mundo. E, talvez amanhã mesmo, essa estrutura, carregada de toda a carga daquilo que ali foi vivido, seja demolida, e em seu lugar seja construída outra coisa, nova, dentro de onde pessoas sentirão e viverão momentos. E com o passar do tempo, talvez esse novo prédio seja mais uma velha construção em ruínas que alguém vai simplesmente ignorar, ou imaginar todo um mundo vendo aquilo. E o ciclo continua.
Estou lento, e uma parte de mim tem pressa. Porque as coisas têm pressa, e a vida nos pede, com urgência, para que a vivamos. A cada murmúrio do relógio analógico eu morro um pouco. Mas vêm os sinais do amanhã, e o amanhã é sempre uma possibilidade de vida. Todo esse corpo que escorre em água pelo ralo precede o instante da ebulição. E o vapor se espalha, se condensa, e escorre em tantas tormentas que mil mares não podem comportar.
A rotina parece um moinho de vento em um lugar em que o ar sopra constante e suavemente. Pequenos redemoinhos à altura do chão nem podem ser sentidos, não fazem diferença alguma. Sentimos o moroso barulho de suas hélices em monótona rotação. E, aqui dentro, estamos nós: à espera do furacão.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Para Bukowski

Ontem na praça morreu um cara. Um tiro. Naquele lugar onde as pessoas morrem, pouco a pouco. O álcool reina ali, algumas outras drogas também. Para escapar, desligar. Minha alma está cinza como o concreto que arde debaixo desse sol. A bebida é a solução dos sofredores, ao que parece. Um caminho mais fácil e agradável, com resultados mais eficazes a curto prazo, do que os esportes ou a religião. Um copo, dois, estou mais falante. Fica mais agradável, suportável, estar vivo. Outros tantos copos, e já nada mais importa. Sou um belo e imaculado semblante de Buda, fedendo a cigarros e ao perfume de algumas das pessoas que abracei. Sou um patético animal errante, pretenso sábio por uma noite. Apressado da próxima dose de prazer, seja ela um outro gole, talvez de uma bebida mais forte, ou quem sabe um beijo com hálito de cerveja. Uma canção na minha cabeça, ou uma vaga melodia: elas sempre estão lá. Uma para cada situação. Peço um cigarro para alguém, que fala e demora mais do que eu gostaria para me dar o meu pequeno momento de abstração enfumaçado. Mas os tragos e os goles já não são suficientes. Tropeçando nas palavras, e saltando abismos no pensamento. É um jogo perigoso. Se bem que dá pra escapar um pouco do cotidiano e do vazio, essas coisas entrelaçadas. Parece mais divertido também do que esse passar horas em frente a um computador, mil estímulos, pequenas doses de alegria, ou revolta, e nada de plenitude. Sinto que meu cinismo é falso, e meu misticismo é de fachada. Não sou ninguém. Dou uma risada que tem um pouco de triste ao final da leitura de cada frase de autoajuda. O corpo marcado, o coração dilacerado, a mente obsessiva. É uma coisa muito pesada e solitária essa de ser uma pessoa. A comunicação sempre é falha, não há entendimento pleno do que um quer dizer ao outro, e ficamos sozinhos. Bem, pelo menos eu fico. Não sei dos outros. Certamente tem gente sofrendo por aí, mas é difícil admitir. Eu não tenho muito como esconder, é evidente, literalmente sai na pele. A vida é curta, e bate um desespero quando não se sabe o que fazer. A gente vai fazendo o que dá, qualquer coisa. Com gente cagando na nossa cabeça, tudo em volta enlouquecendo. Vamos parando de nos impressionar. Sinto falta da ingenuidade. Ver as coisas não é muito legal. Na frente do meu prédio dá pra ver uma sacada onde, quase todo dia, dois moleques ficam jogando bola, e se divertindo bastante. Tudo o que eles precisam é isso: uma bola. E gritam, fazem barulho, visivelmente aproveitando. Intocados pelos males do mundo. Por toda essa dor. Era um pouco isso o que eu queria... Aí concluo que talvez seja por isso mesmo que a gente beba e fuja tanto: pra voltar a ser criança.