segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Diálogo 26 de agosto de 2014

-... que tem a ver com esse lance sobre uma nova dimensão política que essa coisa toda do ocultismo e tal assume, nessa época né, que as pessoas têm acesso a isso sem precisar, assim, da figura de um mestre, ou um centro, essas coisas...
- sim, sim...
- ...
- Cara, ultimamente eu tenho cada vez mais sentido raiva das pessoas, de determinados comportamentos que elas assumem, em determinadas situações e tal.
- Sei qual é...
- Tipo, e eu acabo não sabendo como lidar com isso saca? Como poder romper, ou conviver com certas coisas, não sei bem...
- É, acho que a maioria das pessoas...
- ... acabo indo pra casa frustrado com várias paradas que acontecem sabe? E eu poderia apontar: "Fulano, você tá fazendo isso e isso, e..."
- Cara, acho que a coisa passa muito pelo fato de que a maioria das pessoas não está preparada para ouvir certas críticas, pra...
- Sei como é...
- ... tipo, tem esse lance da persona e tal...
- Como assim?
- Velho, a persona é algo que as pessoas assumem no cotidiano, nos lugares sociais, em determinadas situações... tipo uma máscara... por exemplo, você é um professor de ensino fundamental, e aí acontece que você, sei lá, gosta de sadomasoquismo, tem tendências suicidas ou qualquer porra dessas... e simplesmente não rola de você colocar isso - que no fundo é o que você de fato é, o seu interior mais "verdadeiro", digamos - nesse ambiente... aí você assume uma postura, uma máscara, um personagem adaptado àquela situação ... e, assim, meio que as pessoas fazem isso, ou melhor, são assim, a todo o tempo e em todo lugar...
- Saquei. É como se fossemos todos meio que atores, agindo de acordo com as regras - mesmo que não escritas - o código de comportamento de um determinado lugar.
- Exato, e você nem precisa pensar só em local de trabalho essas coisas... em seu círculo de amizades, porra, família, qualquer lugar... E aí que tá: quando você, digamos, começa a apontar de maneira muito sincera o que você pensa sobre outra pessoa, que é o que você realmente acha que está no mais íntimo, nas mais puras intenções dela, e que acaba expondo seu íntimo também, você quebra essas máscaras, e pô, isso é muito complicado...
- Então de repente o ideal é que as pessoas em geral passem por um processo de certa reconstrução cultural, no sentido de que a sociedade passe a permitir, sei lá, que uma nova cultura permita o comportamento cada vez mais autêntico das pessoas.
- Cara, mas ... como assim? Não, então... Isso é complicado também. Porque...
- ... e tipo, por exemplo, no caso o professor ir se inserindo cada vez mais com sua subjetividade, digamos, no que ele fala pros alunos e tal...
- ... entendo o que você tá querendo dizer, mas não sei se é bem esse o ponto. Na real, acho que esse rompimento é complicado porque, se for pensar, o ambiente social meio que depende disso, dessas máscaras, pra evitar conflitos. É preciso que a pessoa se anule de alguma forma pra poder se inserir num ambiente social. Sei lá, imagina que tem lá um cara que é, pô, assassino, e aí ele frequenta almoços de família aos domingos, e cara, é necessário que ele mantenha o anonimato de quem ele realmente é, porque senão aquele ambiente não vai se sustentar. Além disso, tem todo um equilíbrio energético psíquico também, que seria afetado, vamos supor, expondo as contradições das pessoas e tal... A pessoa passa uma parte muito grande da vida "investindo" naquela persona, naquela máscara, e a mente dela, na distribuição de energia pra funções psíquicas, tem um equilíbrio que depende de que essa quantidade de energia "x" continue sendo aplicada àquela função mental ...ou seja, nego ia surtar, ia dar merda na porra toda... hahaha
- Heheheh... mas, pô... então o que você tá dizendo é que todo mundo então deve se recolher à sua insignificância, tipo, deixar de ser quem realmente se é pra poder manter uma cultura cuja própria base de sustentação é a negação da individualidade?
- Não, é... não é bem uma cultura, são várias escalas... bom, na verdade não seria bem esse o ponto, mas é... você tá dizendo... talvez no fundo então sejamos todos, no nosso íntimo, pessoas totalmente inadaptadas a conviver com outras pessoas... e que se a gente fosse a gente mesmo, ia ser, porra, barbárie total... hahahah, aí é foda...
- Heheh, pois é... vixe, olha quem tá ali.
- Po... então, é uma das pessoas...
- É, é uma delas...
- Haha, falamos e não chegamos em nada.
- Ah, não é bem assim... bom...
- Velho, tô chegando nessa
- Vai partir?
- Oh yeah
- Demorou. Valeu cara, amanhã a gente troca uma ideia.
- Inté!

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Liberdade e coragem de sermos nós mesmos

"Visto que não se é capaz de evitar má companhia, não se deve iludir; deve-se ver a insinceridade por trás da máscara da amizade, a destrutividade por trás da máscara das eternas lamentações sobre sua infelicidade, o narcisismo por trás de seu charme. As pessoas também não devem agir como se tivessem sido levadas por sua aparência ilusória a fim de evitar serem forçadas a uma certa desonestidade consigo mesmas. Elas não precisam falar sobre o que vêem, mas também não têm que tentar convencer os outros de que são cegas.
Se outras pessoas não entendem nosso comportamento, e daí? Sua solicitação de que devemos fazer só o que elas acham é uma tentativa de nos dar ordens. Se isso é ser "associal" ou "irracional" aos olhos delas, que seja. Elas se ressentem principalmente da nossa liberdade e de nossa coragem de sermos nós mesmos. Nós não devemos explicação ou justificativa a pessoa alguma, contanto que nossos atos não a prejudiquem ou a violem. Quantas vidas não foram arruinadas por essa necessidade de "explicação", que habitualmente sugere que a explicação é "entendida", por exemplo, sancionada. Deixe que seus atos sejam julgados, e deles, saltem as reais intenções, mas saiba que uma pessoa livre deve explicação só a si mesma, à sua razão e consciência e, para os poucos que possam ter alegações justificadas de tal explicação."

Erich Fromm, em "Do Ter ao Ser"

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Ao redor

Dou de cara no muro
Uma, duas, três vezes
E o furo da memória, que vaza

É só a chuva lá fora
Antes fosse, antes seja
E quase nada mais

Voltei de viagem ainda agora
Já estive nesse lugar
E as horas que o ponteiro arrasta
Puxam os pés para a estrada
Que aguarda, de mãos atadas
O destino que não se cumpriu

Passos, e refaço o caminho
Tiro espinhos da sola
E quando vejo estou ainda
No agora, no agora, no agora...

Porém, silente, a chama me convém
E, além disso, já estou
Já não é mais aurora
Da noite quero um beijo
Que é senhora vagando
E, como eu, a rasgar
Folha após folha
As saudades desenhadas

Faço por desdenhar do que me agrada
Me distancio, corro e pulo
Na vontade que aguarda meu corpo
E acolhe, gelada, no verão
Estacionando os anseios
Em vagas impressões de um futuro