quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Derretendo

Meus dedos estão derretendo. Enquanto minha pele, ossos, músculos e sangue escorrem derretidos por meu braço, eu penso em alguma coisa que poderia evitar o derretimento do meu corpo físico, que já ocorria. Pelo menos meu cérebro ainda não começou a derreter, mas é só uma questão de tempo. Será que, quando meu cérebro começar a derreter, eu perderei as funções vitais mas continuarei consciente por algum tempo? Bom, não é hora de me preocupar com isso, pois meus braços estão quase que completamente transformados em um líquido viscoso. Minhas pernas também estão em estado crítico. O que me espanta é que não sinto dor ... e à medida que vou me desfazendo do meu corpo, ou ele vai se livrando de mim, sinto uma clareza de pensamentos que nunca senti antes. Quase posso alcançar o céu. Sinto que perder meu cérebro não fará muita diferença nesse momento, pois já virei luz. E o que sobrou do meu corpo escorre pelo ralo mais próximo. E eu já não sou mais quem eu pensava ser, tampouco o que via no reflexo do espelho. Então eu sou um par de asas. Eu vou sair daqui agora, eu vou voar, atingir o espaço, todo o espaço. Já não tenho mais forma definida, e já não sou mais preso pelo tempo. Eu sou o espaço e o espaço é o que sou. Onipresente e atemporal ...

(texto escrito em 2006)

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